30 maio Um ato de amor, por Luis Carlos Rosa
Artigo de autoria do juiz de Direito Luis Carlos Rosa, publicado no dia 21 de maio em coluna semanal no Jornal das Missões, de Santo Ângelo
Faz parte do dia a dia da jurisdição do Juizado da Infância e Juventude o afastamento de crianças e adolescentes da família de origem, hipóteses em que o caminho natural seria o acolhimento institucional, com a inserção das crianças nos “abrigos”. Em Santo Ângelo existe outra alternativa, poucos sabem, mas contamos com um programa municipal que é referência no Estado do Rio Grande do Sul, o programa “Família Acolhedora”, que propicia que crianças e adolescentes que estejam afastados da família de origem por decisão judicial, ao invés de serem acolhidos em abrigos, sejam acolhidos em famílias previamente selecionadas e cadastradas, que ao receber essas crianças e adolescentes em suas residências percebem um subsídio mensal de 01 (um) salário mínimo, pago pelo Município de Santo Ângelo.
Já tratei do tema em outra oportunidade, mas volta a carga pela importância do programa e por sentir no dia a dia, os ganhos que se tem tido. Hoje são cerca de 23 crianças e adolescentes que estão em famílias acolhedoras, estivessem eles nos abrigos o custo para o Município seria algo em torno de R$ 28.000,00, enquanto no acolhimento familiar este custo baixa para cerca de R$ 20.000,00, ou seja, além de propiciar as crianças e adolescentes um atendimento em ambiente familiar, de forma individualizada, o custo é menor.
Aliás o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê como preferencial o acolhimento familiar, ao invés do acolhimento institucional (abrigos), assegurando a mantença da convivência familiar, mesmo nos casos em que a criança está afastada da família de origem.
Mas aí a pergunta: por que então o número de crianças e adolescentes acolhidos em abrigos é infinitamente superior aos acolhidos em acolhimento familiar? Primeiro, porque o acolhimento familiar foi inserido em nosso ordenamento jurídico muito recentemente, no ano de 2009, por força da Lei nº 12.010; segundo, porque a resistência à mudança sempre terá questionamentos a serem superados; terceiro, porque o número de famílias que se dispõem a acolher crianças e adolescentes ainda é muito baixo; quarto pela compra da ideia pelo Poder Público, o que não é o caso de Santo Ângelo, que por suas sucessivas administrações entenderam e entendem os ganhos de um programa nessa natureza.
Ocorre que hoje, muitas poucas pessoas têm disponibilidade de tempo e a vontade de cuidar. Hoje, boa parte das pessoas terceirizam os cuidados com os filhos, deixando-os em creches, ou com babás, o que é um fenômeno das famílias modernas, na medida em que pais e mães, em regra trabalham fora, não tendo tempo para os filhos.
Além disso, existe o sentimento das pessoas de que irão sofrer, quando a criança acolhida retornar à família de origem, ou for encaminhada à uma família substituta (adoção), o que para mim é sinônimo do individualismo que permeia o ser humano. O fato é que as pessoas que se dispõem a acolher têm que ter a compreensão de que o ato de acolhimento é um ato de solidariedade prestado à quem está em situação de vulnerabilidade em um momento difícil da vida.
É necessário pensar mais no outro e menos em nós próprios, o que tenho visto é um ganho de extrema importância para as crianças e adolescentes que vivem esta experiência.
Um grande abraço e um ótimo final de semana a todos.