30 abr Subversivos da Ordem Democrática, por João Ricardo dos Santos Costa
É um grave atentado à democracia brasileira a pretensão contida na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 03, de 2011, aprovada recentemente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. A proposição, de autoria do parlamentar Nazareno Fonteles (PT/PI), pretende limitar a atuação do Poder Judiciário pela interferência do Poder Legislativo em questões que, segundo os arautos defensores da aberração, impliquem em “ativismo judicial”.
Unidos pela ausência de interesse público, o estrato das iniquidades, que se agrupa no Congresso Nacional para romper com o pacto republicano, não esconde suas motivações. São interesses pessoais que pretendem impor a toda sociedade. Fundamentalistas religiosos, conservadores de toda ordem, moralistas da escola de Demóstenes Torres e fichas sujas sequer se constrangem em expor as suas justificativas. Revelam à nação o péssimo manejo do mandato que o povo lhes outorgou.
Nazareno Fonteles, exercendo mandado como suplente na vaga de deputado de outro partido, não aceita a posição do Judiciário em relação a fidelidade partidária. Defende a sua vaga e não a vontade do povo. Nelson Marchesan Jr, relator da PEC na CCJ, é um detrator contumaz do Poder Judiciário. Fixa uma de suas linhas de argumentação na postura da Justiça Eleitoral, ramo do Judiciário que lhe cassou um mandato pela prática de irregularidades. A Frente Parlamentar Evangélica e outros deputados de linha conservadora reagem contra as decisões do STF que efetivaram direitos fundamentais até então negligenciados pelo Legislativo, embora clamados pela sociedade. Os neo-subversivos não atacam a ditadura, mas a democracia.
É relevante saber quem são os personagens e suas motivações à imposição dessa verdadeira mordaça ao Judiciário. Tão ou mais grave do que a mordaça da imprensa. Lamentavelmente, o Congresso persiste com suas dificuldades em adequar-se ao modelo democrático estabelecido no último processo constituinte. A casa do povo atua como uma instituição privada. Não consegue libertar-se do fisiologismo que impera nas suas entranhas e acaba funcionando como um obstáculo aos avanços democráticos. Não percebe que a sociedade reclama é por um Judiciário célere, independente e forte para superarmos as graves injustiças sociais que afetam o povo brasileiro.
Para tanto, já está mais do que na hora dos nossos legisladores portarem-se (todos) como autênticos representantes do povo e presentearem a cidadania com uma legislação processual honesta, enxuta e que seja um verdadeiro instrumento de garantias e efetividade de direitos. O Congresso tem o dever de abolir a absurda instrumentalidade que burocratiza o processo, viola direitos e liquida com a função jurisdicional. Somos, no planeta, recordistas em quantidade de recursos. É um sistema que tem dupla (des)serventia: garantir a impunidade dos poderosas e negar direitos aos pobres.
* Juiz de Direito e ex-presidente da AJURIS
Artigo publicado em Zero Hora no dia 27/4/2012, pg 17.