15 ago Perdão pelos meus erros, por Luis Carlos Rosa
Artigo de autoria do juiz de Direito Luis Carlos Rosa, publicado no dia 30 de julho em coluna semanal
no Jornal das Missões, de Santo Ângelo
Nas três últimas terças-feiras realizamos nas dependências do Fórum de Santo Ângelo o 1º Curso de Preparação à Adoção, para as pessoas que estão se habilitando à adoção. Nestes encontros, várias foram as abordagens, incluindo questões jurídicas, motivações, aspectos psicológicos, sociológicos, tempo de espera, perfil das crianças aptas à adoção, entre outros, estando previsto, ainda, um quarto encontro onde se pretende expor experiência de quem já adotou, de quem foi adotado e de técnicos que trabalham diretamente com as crianças que estão afastadas de suas famílias.
A decisão de adotar, verdadeiramente, não é uma decisão fácil, precisa ser bem amadurecida, precisa de uma preparação, precisa ser bem compreendida. Uma gravidez indesejada até pode ocorrer, mas uma adoção não, quem se propõe a adotar certamente tomou essa decisão após ampla reflexão, sabe ou deveria saber as repercussões daí decorrentes, o que por si só justifica a realização do Curso de Preparação, e que doravante será uma exigência para todos quantos venham a se habilitar à adoção.
Hoje temos na Comarca de Santo Ângelo, cerca de 50 pretendentes à adoção, entre casais, ou pessoas solteiras, separadas, ou divorciadas, que estão devidamente habilitados, destes a grande maioria pretende adotar crianças até 02 anos de idade, somente uma fração muita pequena aceita adotar crianças acima de 05 anos e menos ainda de adotar um grupo de irmãos, estando aí um dos grandes problemas hoje enfrentados para quem trabalha tentando colocar essas crianças em uma família substituta, mediante adoção.
A realidade do passado, onde se disponibilizavam crianças recém-nascidas à adoção, já não existe mais, dificilmente isso acontece, ao contrário de crianças com uma idade um pouco mais avançada que acabam por ser o grande contingente disponível à adoção, normalmente acompanhada de irmãos.
A lei exige que se de prioridade para a família de origem, buscando uma reestruturação dessas famílias, ou a colocação da criança com parentes, tentativas que por vezes demoram um certo tempo, para só depois se buscar a solução da destituição do poder familiar e por fim a colocação em família substituta pela via da adoção.
Hoje posse dizer que de tanto presenciar frustrações nestas tentativas de reestruturação, acabei por me tornar menos tolerante com essas situações, não que não acredite na mudança de conduta e proceder das pessoas, mas vejo que não se pode ser complacente com pessoas que em nada contribuem, a que nada aderem e que acabam por condenar seus filhos a esperar por uma mudança que não ocorre, falo de mães e pais drogaditos a quem se oportuniza tratamentos, sem adesão, a pessoas sem comprometimento com a mudança, que dizem que vão mudar e no outro dia estão cometendo os mesmos desatinos.
Que sabe não deveria, mas acabei me tornando mais duro, me sinto responsável pelas histórias de vida destas crianças que convivem com o desamor, com a negligência e merecem uma vida nova junto a pessoas dispostas a dar um lar, carinho, proteção e amor no mais amplo e puro sentido.
Mas não vão pensar os leitores que essa seja uma decisão fácil, depois de quase 20 anos de judicatura, digo que a decisão pela destituição do poder familiar é, para mim, a mais difícil de ser tomada.
Não é fácil você sentenciar que aquele pai, que aquela mãe, na prática, deixam de ser pais. Não é possível tomar uma decisão desta significância existindo dúvida, para isso é preciso ter a convicção que realmente aqueles pais, não merecem assim ser chamados e precisam coletar as provas necessárias para se ter essa convicção.
Se cometi ou venha cometer erros nestes julgamentos, sei que não há perdão suficiente nesta existência, porque os filhos, com certeza, são o que temos de mais caro nas nossas vidas, como escrevi em uma das colunas anteriores, por eles atravessamos oceanos.
Utilizando das palavras de Piero Calamandrei na célebre Oração do Juiz, adaptada às destituições do poder familira, digo “Nunca me esqueço de que sou uma pobre criatura humana, escrava do erro e que ao tomar uma decisão extrema de afastar definitivamente os filhos de seus pais, não consigo reprimir a perturbação da consciência, tremendo diante de um ofício que, em última instância, só pode ser teu Senhor”.
Um ótimo final de semana a todos.