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O trabalho na adolescência, por Luis Carlos Rosa

O trabalho na adolescência, por Luis Carlos Rosa

Artigo de autoria do juiz de Direito Luis Carlos Rosa, publicado no dia 7 de maio em coluna semanal no Jornal das Missões, de Santo Ângelo

Na condição de magistrado, com atuação no Juizado da Infância e Juventude, ao me propor escrever e externar minhas posições nesta coluna semanal, tenho a percepção de que é necessário medir as palavras, a fim de não ser mal interpretado. Neste contexto, há tempo estou por escrever para esta coluna acerca do trabalho na adolescência, notadamente diante do regramento legal vigente no Brasil que proíbe o trabalho para menores de 14 anos, bem como o trabalho noturno, perigoso e insalubre para adolescentes menores de 18 anos de idade.
Além disso, para quem não sabe, existe uma enorme lista de atividades elencadas como “piores formas de trabalho”, que afastam a possibilidade dos trabalhos braçais para adolescentes, incluindo-se aí os serviços na construção civil, além de outras atividades, justamente aquelas que acabam sendo a válvula de escape para quem tem uma baixa escolaridade, vivendo na linha limítrofe da pobreza.

Já relatei em colunas anteriores a minha história de vida, incluindo o fato de ter uma carteira profissional assinada antes mesmo dos 14 anos de idade, relatei ter trabalhado vendendo picolés, entregando jornais, carregando caminhões e, inclusive, na construção civil, com isso não prego o trabalho na adolescência de forma indiscriminada, longe disso, acho que se naquela época tivesse tido a oportunidade de só estudar, se não tivesse tido a necessidade de trabalhar para ajudar a família, certamente poderia ter uma caminhada bem menos penosa.

Contudo, entendo que o trabalho socializa a pessoa, que é um fator importante de formação da personalidade, que nos faz crescer, claro, um trabalho que tenha a possibilidade de socializar, que dê a possibilidade de crescimento, esse trabalho a meu juízo deve ser incentivado e fomentado, com o devido controle social e, se necessário, judicial.

Muitas pessoas humildes chegam a mim nas audiências, trazendo essa questão, famílias, em regra, extremamente numerosas, muitos analfabetos, moram muito mal, sobrevivendo de trabalhos penosos, pessoas que vivem com extremas dificuldades, pessoas para as quais não existem políticas públicas consistentes, que propiciem um crescimento pessoal e social, um contingente invisível para a sociedade, situação que acaba por impor às famílias o trabalho informal dos integrantes do grupo, incluindo-se aí os filhos adolescentes.

De um lado existe a legislação prevendo a proibição do trabalho dos adolescentes nas situações já descritas acima, de outro lado a realidade nua e crua destas famílias, a qual os empurra para a necessidade de trabalhar e a inserir os filhos em atividades laborativas informais que auxiliem no sustento.

As questões envolvendo o trabalho infantil e o trabalho na adolescência não são da alçada da Justiça da Infância e Juventude, mas sim da Justiça do Trabalho, até por isso evito tecer outras considerações, contudo essa questão sempre vem a tona nas inúmeras audiências que se realizam no Juizado da Infância e Juventude, notadamente nas audiências em que existe a evasão escolar.

Trabalhei sim durante minha adolescência, em atividades que hoje não seriam permitidas, mas nunca, jamais, deixei de faltar um dia de aula sequer, lembro-me, perfeitamente, que na única vez que não fui à escola foi por questões médicos, até por isso não consigo admitir justificativas esdrúxulas de pais que argumentam com a necessidade dos filhos trabalharem para a falta ou a evasão escolar total.

Tenho a convicção que o trabalho socializa, mas não pode ser escravizante, não pode servir como argumento para o abandono ou a infrequência escolar. A educação é a única forma de emancipação social possível, para quem não nasceu em berço de ouro, para mim foi assim, creio que para muitos que estão a ler essa coluna também tenha sido assim.

Um bom final de semana a todos.