06 ago Efetividade da jurisdição é o principal desafio do Judiciário para o presidente da AMB
João Ricardo dos Santos Costa é o destaque desta semana
do Especial XI Congresso Estadual de Magistrados.
O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo dos Santos Costa, é o destaque da edição desta semana do Especial XI Congresso Estadual de Magistrados. Em entrevista ao Departamento de Comunicação da AJURIS, o magistrado, que presidiu a Associação no biênio 2010/2011, aponta como principal desafio do Poder Judiciário a efetividade da jurisdição. “Responder com rapidez aos anseios da sociedade. Atuar de forma mais eficaz no que diz a prestação jurisdicional”, lista.
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Para atingir esse objetivo, a AMB desenvolve duas campanhas: a Justiça Restaurativa do Brasil, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para a difusão do modelo de autocomposição de conflitos nos país; e a Não Deixe o Judiciário Parar, que tem como meta destacar os principais segmentos responsáveis por litígios. Esse diagnóstico é considerado importante, pois permite ao Judiciário direcionar as ações para minimizar o problema. Os dois temas integram o programa transmitido pela Radioweb AJURIS.
O Especial XI Congresso Estadual de Magistrados tem o objetivo de antecipar assuntos que estarão em pauta no evento promovido pela Associação e, com isso, estimular a apresentação de teses pelos magistrados. A primeira edição internacional do Congresso Estadual de Magistrados será realizado de 24 e 26 de setembro, em Montevideo, capital do Uruguay, e terá como tema Efetivar Direitos: O Desafio da Magistratura.
Informações sobre inscrição, transporte, programação e o regulamento estão disponíveis AQUI . Os magistrados podem enviar teses até o dia 10 de setembro.
Na entrevista, o magistrado também fala sobre a realização do XXII Congresso Brasileiro de Magistrados, que será realizado de 29 a 31 de outubro, no município de Rio-Quente (Goiás). Mais informações sobre o evento AQUI.
Entrevista
O tema do Congresso Estadual de Magistrados neste ano será Efetivar Direitos: o desafio da Magistratura. Na sua opinião, quais são os principais desafios da Magistratura Estadual atualmente?
Eu diria que o principal desafio da Magistratura coincide com o grande desafio do Poder Judiciário brasileiro que é ser efetivo, ser célere. Responder com rapidez aos anseios da sociedade. Atuar de forma mais eficaz no que diz respeito à prestação jurisdicional. Então, esse é o tema central hoje dos desafios do Poder Judiciário. Dentro dessa questão, tem uma série de desdobramentos, uma série de caminhos que nós podemos percorrer exatamente no sentido de buscar essa efetividade, buscar um Judiciário que venha a corresponder aos anseios que o povo brasileiro hipoteca para o Judiciário. Nós pensamos muito criticamente essa forma de atuação da Justiça brasileira, acho que a nossa ineficiência está muito ligada a maneira arcaica com que o Judiciário ainda vem fazendo a sua intervenção. A forma como ele responde as demandas processuais continua sendo a mesma dos anos 1800. Então, esse é o primeiro problema. Nós temos que mudar a nossa forma de intervenção. E, nesse sentido, a AMB tem duas frentes ligadas nessa área da efetividade da jurisdição. Duas frentes que para nós são os projetos mais importantes da nossa gestão. Um deles é a campanha que nós vamos desencadear no sentido de não deixar o Judiciário parar, a campanha Não Deixe o Judiciário Parar, e a outra é o estímulo e a divulgação de outros métodos de autocomposição de litígios, no caso da Justiça Restaurativa, que é um projeto que está em pleno andamento.
Em que fase está a campanha nacional que a AMB tem realizado para a difusão da Justiça Restaurativa em parceria com o CNJ?
Nós fizemos essa parceria e já começamos o primeiro eixo que é a ampla divulgação. Entramos no segundo eixo desse projeto que é a capacitação de magistrados. Em Brasília, nós tivemos um curso com bastante frequência de magistrados no sentido de capacitação de juízes nessa área que para nós é muito importante, de certa forma desafiadora, porque é uma forma de intervenção que nós estamos vendo como muito positiva pelo conteúdo de pacificação, pelo conceito de pacificação que insere essa modalidade de intervenção de autocomposição de conflitos. Então, nós estamos criando um conceito dentro do Poder Judiciário de pacificação do conflito, e não da forma tradicional de resolução desses conflitos.
Como o senhor avalia a importância da Justiça Restaurativa e de outros meios de autocomposição de conflitos no sentido de auxiliar para uma jurisdição mais efetiva?
Esses são os caminhos que nós podemos percorrer, considerando aquilo que mencionei, a forma tradicional tem demonstrado que é ineficaz. Não só o modelo de atuação jurisdicional com aquela ideia coercitiva da decisão judicial, ela vem se demonstrando ineficaz em alguns casos, em boa parte deles, mas também com aquela ideia de que essa forma coercitiva, em determinados litígios, também atinge uma disfuncionalidade, porque aborda individualmente litígios que são coletivos. Então, por essa dupla via, o Judiciário tem deixado a desejar na sua intervenção.
A AMB também tem uma atuação efetiva no combate ao uso predatório do Judiciário. O quanto essa questão prejudica a eficiência do Poder Judiciário?
Nós estamos lançando, esse projeto que é o Não Deixe a Justiça Parar. Ele vai ser lançado através de uma pesquisa que nós fizemos em que levantamos os cem maiores litigantes do Brasil e fizemos um corte para ver quem são os responsáveis por metade dessa demanda dos cem maiores litigantes. É uma pesquisa que envolve 11 Tribunais do país e traz dados reveladores. Dentro dessa metade dos maiores litigantes tem apenas três seguimentos: o Estado, os municípios e os bancos, o sistema financeiro e, em alguns estados, a telefonia também. Então é uma pesquisa importante porque, se nós quisermos uma política eficaz em relação à diminuição dessa demanda extraordinária, temos onde focar, que é nos setores onde mais produzem litígios no país. É uma informação importante para se criar uma política pública no Poder Judiciário. É um trabalho que nós entendemos, lá na AMB, extremamente importante, porque se o Judiciário for efetivo, se der uma resposta rápida, se ele for célere, a Magistratura está sendo valorizada cada vez mais, por estar prestando um excelente serviço à sociedade brasileira. Então, para nós, esse projeto é fundamental.
Que ações integram essa campanha?
Primeiro o lançamento dessa pesquisa que nós vamos fazer em Brasília, no dia 11 de agosto, coincidentemente o dia em que se comemora a instalação dos cursos jurídicos no país. Paralelo a essa campanha, que nós vamos dar visibilidade a um problema, que é o problema maior do Judiciário, que é o congestionamento, nós vamos mostrar para a sociedade quais são os setores que estão hoje criando obstáculos ao acesso à Justiça, porque a morosidade gera obstáculos ao acesso à Justiça. A Justiça demorada é inacessível. Vamos dar visibilidade a isso e, paralelo a isso, estamos trabalhando a construção, já com a adesão do Conselho Nacional de Justiça, de um projeto para criar um núcleo de inteligência do litígio no Brasil, que vai estudar, identificar, fazer diagnósticos sobre as causas desse litígio. O que nós queremos é atuar antes do ingresso da ação, ou seja, criar um mecanismo que venha a blindar o sistema de Justiça brasileiro do seu uso indevido, do seu mau uso, para que o sistema possa atender aqueles que realmente necessitam.
Além desses segmentos que sobrecarregam o Judiciário, a sociedade brasileira é conhecida por ser litigiosa. O quanto essa questão de existir uma cultura do litígio prejudica o Judiciário?
Essa cultura também se constrói através de um estímulo. E esse estímulo vem, penso eu, da reiterada postura de violações de direitos das pessoas por parte de grandes corporações. O próprio Estado vem, reiteradamente, violando o direito das pessoas, e as pessoas, a cidadania, não fica resignada por muito tempo, vem acumulando e começa, então, a responder a isso. Claro que depois que isso se introjeta como uma cultura, já não se querer tentar pacificamente resolver o problema, já se vai diretamente ao Poder Judiciário. Como, felizmente, o acesso é facilitado, hoje nós temos Defensoria Pública, temos uma série de mecanismos de acessibilidade, esse fenômeno acaba criando essa situação hoje que nós temos no Brasil.
O Poder Judiciário do Rio Grande do Sul é reconhecido como um dos mais eficientes do país. O senhor credita isso a quais fatores?
Bom, isso é uma percepção que os dados estatísticos e os estudos sobre o litígio no Brasil têm demonstrado. A cada ano, acredito que nós estamos na sétima edição do Justiça em Números, que é o trabalho estatístico mais completo que tem sobre a Justiça brasileira, que é realizado pelo Conselho Nacional de Justiça, e ali mostra que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul tem alcançado índices de ponta em relação aos outros Tribunais brasileiros. Eu atribuo a isso a capacidade extraordinária do nosso Tribunal de Justiça de ter desenvolvido alguns projetos de gestão e de planejamento estratégico. Nós pudemos observar isso nos últimos anos, um investimento muito grande, um avanço muito grande e permanente no âmbito do planejamento estratégico, o que possibilitou desenvolver projetos de gestão bastante vanguardistas. Eu lembro que, há uns dez anos ou mais um pouco, houve um investimento em capacitação de juízes na área de gestão judiciária. Um grupo de juízes, através da Escola da Magistratura, fez um convênio com a Fundação Getúlio Vargas e um mestrado em gestão judicial. E, casualmente, os juízes que fizeram esse mestrado, durante todo esse período da capacitação até aqui, sempre tiveram envolvidos nos projetos de gestão e de organização da Justiça aqui no Estado do Rio Grande do Sul. Então, esse investimento nós podemos perceber que resultou, concretamente, efeitos. Acredito que esse seja um dos fatores que vem a ser determinante a essa posição no ranking nacional do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
O senhor falou, no começo da nossa conversa, sobre os principais desafios do Judiciário. Diante dessa realidade, como projeta o futuro do Judiciário nos próximos anos?
Eu acho que está na linha desses projetos que estamos desenvolvendo. Acho que esses projetos representam uma revolução na sua forma de intervenção, quer dizer, troca a solução dos conflitos através do método tradicional, que é o julgamento, a decisão judicial, como maneira de compor por um sistema de autocomposição, em que as partes vão construir a reconstrução do tecido rompido como o fato que gerou o litígio. Isso é, vamos dizer assim, o futuro, o que nós estamos caminhando. E um outro passo é a intervenção através de respostas coletivas, através de ação coletiva para os macrolitígios, aqueles litígios que afetam comunidades inteiras, milhões, milhares de pessoas. Ao invés de uma intervenção individual, como estamos tratando hoje, nós partimos então para uma atuação de maior abrangência, uma atuação em que a intervenção da Justiça em uma única situação venha a atingir milhões de pessoas.
A AMB realiza o Congresso Brasileiro de Magistrados em outubro. O tema central será O Poder Judiciário e a Consolidação da Democracia: O Papel da Justiça na Sociedade Contemporânea, que casa com a reflexão que a AJURIS fará sobre o desafio de efetivar direitos. Qual é a expectativa com a realização desse evento?
Olha, é um Congresso que tem esse viés bastante prospectivo e nós pretendemos tirar desse evento as diretrizes de intervenção e de atuação para o Judiciário do futuro. Então os debates que irão ser estabelecidos trazem questões desafiadoras e, quando se reúne juízes de todo o país, é muito importante que os temas desafiadores sejam colocados na pauta para que sejam discutidos e que nós possamos adquirir um acúmulo e fazer da nossa Justiça uma Justiça melhor para o nosso povo.
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