06 fev A democracia não dá posto ao mais antigo, por André Luis de Moraes Pinto
Nos últimos dias, a sociedade gaúcha foi sacudida com decisão do ministro Luiz Fux, que suspendeu a posse da administração eleita do Tribunal de Justiça, determinando a permanência dos gestores, cujo mandato findava, até deliberação do plenário do STF. O pronunciamento judicial atende pretensão que quer ver preponderar uma hermenêutica literal do artigo 102 da Lei Orgânica da Magistratura. É certo que a Loman dita aos tribunais que elejam para os cargos de direção os seus membros mais antigos, todavia, não se pode desconsiderar o pormenor que a norma, editada anos antes dos ventos libertários, deve ser interpretada à luz dos princípios que permeiam a Constituição federal.
As acentuadas conquistas democráticas das últimas décadas não permitem que hoje mais se caminhe com os coturnos de 1979. O olhar cultural tem de ser renovado, para uma exegese valorativa mais consentânea. Se antes se admitia que o mais antigo impusesse a sua solitária vontade, hoje importa ter a sensibilidade de “atualizar” a letra da lei. Daí que o critério da antiguidade, se rasamente considerado, vai se mostrar insuficiente ante o déficit de democracia dele emergente.
Por isso, de todo regular o procedimento de escolha adotado, a partir da interpretação de que a eleição deva se dar entre a pluralidade dos desembargadores mais antigos aceitantes, o que vivifica a dicção do art. 102 da Loman, conferindo legitimidade aos dotados de mérito eleitoral. Impende, ainda, ser salientado que a releitura racional das normas, não implicando a violação delas, modo voluntarista e descontextualizado, constitui prática usual e saudável. Um exemplo apenas: foi isso que fez o STF quando arredou do cenário jurídico previsões da Lei de Imprensa consideradas divorciadas da garantia à liberdade de expressão. Com efeito, por essas e outras razões não há que falar em crise no Tribunal de Justiça. Na marcha eleitoral, houve cumprimento à lei; diante da medida judicial desfavorável (a qual se respeita), buscou-se a via recursal adequada; mantida a decisão monocrática, anuncia-se o seu efetivo cumprimento. Louva-se, assim, a postura dos que exercem papel de líderes no TJRS, eleitos ou não (alguns deles forjados na apropriada escola de liderança política – a entidade de classe), em face da unidade demonstrada, reverberada unissonamente na magistratura de base, que empresta aos eleitos irrestrito apoio, pela estabilidade institucional articulada e pela preservação da credibilidade e da reconhecida boa imagem da Justiça gaúcha.
André Luis de Moraes Pinto – vice-presidente de Patrimônio e Finanças da AJURIS
Publicado no jornal Correio do Povo do dia 06/02/2012