09 mar A cultura da paz X a cultura do litígio, por Luis Carlos Rosa
Artigo de autoria do juiz de Direito Luis Carlos Rosa, publicado no dia 8 de março em coluna semanal no Jornal das Missões, de Santo Ângelo
Hoje no fórum de Santo Ângelo tramitam cerca de 35.000 mil processos cíveis, um número verdadeiramente assustador. Nosso Fórum, localizado em zona central privilegiada da cidade chama a atenção pela imponência, as pessoas podem pensar que é um exagero, que boa parte daquelas salas estão desocupadas, ociosas, que seja um desperdício, no meio de tamanha crise, que nada. Na condição de Diretor do Foro posso afirmar que hoje já temos uma falta de espaço, muito porque boa parte das nossas salas estão ocupadas por milhares de processos arquivados, são pilhas e mais pilhas de papel, que cada dia cresce mais, muito destes processos tramitaram durante vários anos, trazendo histórias de ódio, de irracionalidades, de litígios, que foram sendo alimentados durante o tempo do processo, que muitas e muitas vezes poderiam ser evitados, ou que poderiam ter tido uma solução diferenciada, em um tempo infinitamente inferior, com diálogo, com entendimento, com conversa.
Acredito que tudo possa ser resolvido com o diálogo, com a conversa, com uma dose de tolerância, colocando-se no lugar do outro, porém, o que temos hoje é uma cultura voltada para o litígio, nos cursos de Direito de uma forma geral o ensino sempre foi focado na solução do litígio, os profissionais do Direito – onde me incluo – fomos todos educados para a peleia judicial, para a briga, estudamos, todos, inúmeras teorias, leis, doutrinas, jurisprudências que buscam dar soluções para as questões jurídicas que possam surgir nos processos, tendo os Cursos de Direito várias cadeiras de processo civil, processo penal, processo do trabalho, além dos Direito Civil, Direito Penal, Direito do Trabalho, Direito Tributário, Administrativo, Comercial, Previdenciário e outras tantas. Ou seja, a matriz curricular que nos foi posta e que ainda é posta para os estudantes de Direito está focada em especial no litígio, assim fomos todos forjados, assim a sociedade pensa. Ao mínimo dissabor, ao mínimo vacilo, lá vem mais um processo, sem que ao menos venhamos tentar o diálogo, sem que ao menos venhamos a conversar, estamos todos menos tolerantes, parece que temos cifrões nos olhos e somos alimentados e encorajados a tê-los, onde vamos parar…, não sei.
O fato é que diante de tamanha litigiosidade, de tamanha intolerância, do aumento geométrico dos processos judiciais, da incapacidade do Estado em dar uma solução rápida e adequada para tamanho número de processos, outra via para a solução dos conflitos passou a ganhar força, o que, aliás, deveria ser a regra, trata-se da mediação, do diálogo, propiciando as pessoas que venham sentar ao redor de uma mesa, frente a frente, colocando e expondo suas diferenças, sem ranços, sem intolerância, buscando uma solução que seja construída pelas próprias partes, trata-se da mediação, trata-se da cultura da paz, em substituição à cultura do litígio, tema que pretendo voltar a abordar na próxima coluna.
Um bom final de semana a todos.