09 abr “Lições em tempo de crise”, por Carlos Fernando Noschang Júnior
É indiscutível o espírito de solidariedade que se disseminou pelo mundo em razão das necessidades advindas do confinamento. O Poder Judiciário, buscando fazer sua parte, já alcançou mais de R$ 12 milhões a entidades de saúde em todo o Estado, lançando mão da verba oriunda das transações penais. O dinheiro vem sendo empregado na aquisição de equipamentos (respiradores, camas hospitalares, entre outros) e medicamentos.
Além disso, o Tribunal de Justiça, quando da eclosão das medidas de maior restrição, imediatamente fez a doação de máscaras e álcool em gel, que havia adquirido, para a Secretaria de Administração Penitenciária, já que deliberou pelo teletrabalho. Há, ainda, inúmeras outras iniciativas de magistrados que se envolveram de cabeça em atividades de amparo aos necessitados: colegas do projeto Cozinha Solidária prepararam, de suas casas, refeições para distribuir, tendo em um único dia servido mais de 200 marmitas; uma colega de Bento Gonçalves, habilidosa em costura, confeccionou pessoalmente duas centenas de máscaras para doação. Há várias histórias.
Mas há outra tendência digna de nota, até porque vinda de quem pouco se espera. É a movimentação em favor do próximo surgida entre a massa carcerária. Seja por proposição externa ou por resolução deles próprios, em diversas casas prisionais presos realizam atividades visando ao altruísmo humanitário. E os exemplos são vários: confecção de máscaras de proteção no Presídio de Lajeado, nas Penitenciárias Modulada de Charqueadas, Estadual do Jacuí e de Santa Rosa; a confecção de lençóis para hospital, no Presídio de Cruz Alta; apenados voluntários na construção de leitos e de estruturas de isolamento, em diversas comarcas do Estado, entre outros. Todas são atividades que não têm qualquer outra finalidade senão auxiliar as pessoas que, sozinhas ou até mesmo em razão das restrições governamentalmente impostas, não poderiam manter a si e a seus familiares.
Pode-se concluir, a partir de relatos que tais, que a solidariedade é um bem tão relevante que até mesmo na mente e no coração daqueles indivíduos reputados como irrecuperáveis consegue adentrar. Esse é um valioso indício de que, tratados de forma adequada, com dignidade e humanidade, recebendo oportunidades, capacitação e instrução, a par do necessário acompanhamento psicossocial, a maior parte dos reeducandos tem jeito.
Essa pandemia ainda tem muitas lições a nos ensinar.
Carlos Fernando Noschang Júnior é juiz de Direito da 1ª Vara de Execuções Criminais Regional de Novo Hamburgo. Artigo publicado na edição do dia 9 de abril de 2020 do Jornal NH.