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Metro Jornal: O que os adolescentes pensam da redução da maioridade penal

Metro Jornal: O que os adolescentes pensam da redução da maioridade penal

Em discussão. Projeto que quer reduzir a idade de responsabilização criminal de 18 para 16 anos está pronto para ser votado. O Metro Jornal esteve ontem na Fase para saber: o que eles, os adolescentes, pensam sobre a redução da maioridade penal?
  

Domingo, 7 de junho, 22h. Um jovem de 18 anos, interno da Fase (Fundação de Atendimento Socioeducativo), de Porto Alegre, faz uma monitora refém e exige: ele quer ir para o Presídio Central. Três horas depois a situação é controlada e, no dia seguinte, dez internos são transferidos para a cadeia, escancarando uma discussão que o Brasil está tendo que enfrentar: será melhor – ou pior – manter adolescentes dos 16 aos 18 anos em unidades socioeducativas ou mandá-los diretamente para o sistema carcerário para dar um basta na violência? O Metro Jornal esteve ontem na Fase para saber: o que eles, os adolescentes, pensam sobre a redução da maioridade penal?

Quem percorre os corredores de unidades como a Padre Cacique, a qual a reportagem teve acesso, já sabe: enquanto alguns dos internos sentem arrepios só de pensar em cair nas galerias do Central outros mal podem esperar a hora disso acontecer. “Imagina ir pra lá no meio dos caras! Os caras vão usar os guris pra fazer a caminhada deles [no mundo do crime]!”, dispara P.S., 18 anos, apreendido pela sexta vez por tráfico de drogas, na capital. Desde os 15 anos ele vive entre idas e vindas na Fase, mas não suporta a ideia de ele e outros tantos caírem direto no Central. “Lá vão se sentir livres pra usar drogas, usar celular. Lá não tem restrição, não tem mesmo. É a mesma coisa que tu tá na rua, tu tem tudo. Não pode sair do lugar, mas tu pode ligar pra quem tu quiser. Aqui, não”, avalia. P.S. é contra a redução da maioridade penal, assim como L.S., 18 anos.

O jovem de Lajeado, cumpre medida por homicídio. Ele diz que já sabe o que vai acontecer com os guris que seguirem para os presídios: “Eles vão ter que entrar pra uma facção. São poucos os que vão mudar de vida. Aqui nos colocam limite. Lá, não”, avisa. Mesmo cercado de opiniões contrárias, G.L., 18, apreendido por tráfico, assalto e formação de quadrilha é irredutível: é a favor da redução. “O cara vai lá e mata alguém da tua família, vem aqui pra Fase e fica no máximo três anos. Tu perde uma pessoa que tu ama por três anos? Se a pena fosse mais dura iam pensar melhor antes. Tem que tomar um susto maior”, acredita. “Pelo pouco que eu tenho observado, eu percebo que vai ser aprovado, né?”, observa o jovem que tem um irmão preso no Central e não quer seguir o mesmo caminho.

Diretor da unidade Padre Cacique, Cláudio Gonçalves diz que o assunto vem sendo muito debatido entre os internos, seja em sala de aula, com os monitores ou entre eles mesmo. Como personagens principais da discussão todos têm posição.

A discussão

• De volta ao debate. De forma inédita, a redução da maioridade penal, que há quase duas décadas esbarra na recusa dos parlamentares de discutir o tema, ganhou respaldo para ir à votação na Câmara.

• O que quer. A primeira tentativa de avaliação foi frustrada por manifestantes na semana passada. Amanhã, o relator da proposta, deputado Laerte Bessa (PR-DF), vai pedir que jovens que cometam crimes sejam punidos como adultos, não mais aos 18 anos como atualmente, mas a partir dos 16 anos.

• Alas específicas. Os infratores seriam colocados em celas a serem criadas em alas específicas, o que para especialistas na área não faria muita diferença.

• Votação. Se aprovado, irá à votação na Câmara e no Senado com ressalva de que ao final seja decidido pela população, em referendo.

E eles o que pensam?

“A OAB/RS é contra a redução da maioridade penal. A alteração proposta não apenas não teria o condão de reduzir a criminalidade como, ao contrário, tornar-se-ia causa de aumento.”
MARCELO BERTOLUCI, PRESIDENTE DA OAB/RS

“A Ajuris se contrapõe veementemente à alteração da idade penal, por se tratar de medida inconstitucional e que viola cláusula pétrea.” EUGÊNIO COUTO TERRA, PRESIDENTE DA AJURIS

“A redução não é a solução. A educação, sim, é o caminho mais eficaz para diminuir a criminalidade.” NILTON LEONEL ARNECKE MARIA, DEFENSOR PÚBLICO£GERAL DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

“Nós precisamos acreditar no ser humano. Quando se deseja diminuir a idade penal, isso é desacreditar nos nossos jovens.” DOM JAIME SPENGLER, ARCEBISPO METROPOLITANO

Justiça ou vingança?

Especialistas no tema se dividem em posições contundentes. Uns falam em justiça outros temem o sentimento de vingança. Todos são unânimes em dizer, porém, que alguma coisa precisa ser feita. Juiz de Direito aposentado e conselheiro da Unicef, João Batista Costa Saraiva observa muitas pessoas simplificando uma questão muito mais complexa. “O sistema com todas as deficiências que possui é muito superior ao sistema penitenciário do adulto. Mal ou bem ele está muito mais preservado dessa contaminação criminal. Temos deficiências tremendas, mas o sistema prisional está completamente falido, não vai mudar nada na criminalidade. Essa cooptação de jovens vai continuar e vai pegar mais e mais cedo, só vai mudar a faixa”, avalia. Ele tema pelo sentimento de vingança. “A pessoas tem que refletir: vai resolver o problema? Poderá satisfazer um sentimento de vingança de questões muito pessoais que eu compreendo, mas não acredito que possa melhorar, pelo contrário, pode agravar”, avisa.

Não é o que pensa o presidente da ONG Brasil Sem Grades, o empresário Luiz Fernando Oderich, que perdeu o filho de 26 anos assassinado na véspera da formatura, em 2002. “Quando existe um crime existem três sujeitos: o menor que cometeu o crime, a vítima com seus familiares e a sociedade que fica com medo. É preciso dar uma resposta a essa sociedade. A dor da pessoa não vai diminuir nem aumentar pelo fato de ser menor ou maior, para quem perde um filho a dor é igual. É uma bobagem dizer que presídio é universidade do crime. A universidade deles é a rua”, sentencia.

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