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Cumpra-se a lei, por Luis Carlos Rosa

Cumpra-se a lei, por Luis Carlos Rosa

Artigo de autoria do juiz de Direito Luis Carlos Rosa, publicado no dia 15 de outubro
em coluna semanal 
no Jornal das Missões, de Santo Ângelo

Quem lê o Estatuto da Criança e do Adolescente, observa que ali está idealizado um mundo perfeito, um mundo em que é assegurado a todas as crianças e adolescentes o direito a vida, à saúde, ao alimento farto, a moradia digna, ao afeto, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, à convivência familiar e comunitária e à educação, incluindo-se aí o acesso à educação infantil e a pré-escola.

Se um alienígena aqui chegasse e se ativesse a ler a legislação, imaginaria uma sociedade totalmente diferente da que temos, onde crianças e adolescentes teriam acesso à saúde, não faltariam medicamentos, procedimentos médicos, tratamentos, todos estariam morando com dignidade, frequentando boas escolas, estariam protegidos em suas famílias, teriam a sua disposição serviços de atendimentos sociais e psicológicos eficientes, com uma estrutura toda voltada à proteção.

Não é essa realidade que habita as salas de audiências dos Juizados da Infância e Juventude, onde crianças e adolescentes desafortunados estão envoltos em um caos social e existência, inseridos em famílias desestruturadas, muitas lutando, literalmente, pela sobrevivência, morando em casebres insalubres, analfabetas ou semianalfabetas, excluídas naturalmente pela sociedade, vivendo de migalhas, de benefícios previdenciários assistenciais, cestas básicas, campanhas de agasalho, bolsa- família e por aí vai.

Diz o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 23, que “A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar”, contudo, sintomaticamente, todas as crianças e adolescentes que habitam nossos abrigos, ou estão inseridas em programa de acolhimento familiar, provêm de famílias, literalmente pobres, uma grande parte a baixo da linha da pobreza, vivendo em situação de miserabilidade.

Não existem crianças e adolescentes disponíveis à adoção, que não sejam oriundas de famílias pobres, aliás, quase a totalidade de adolescentes recolhidos no sistema FASE e que estão cumprindo medidas socioeducativas provêm de famílias pobres.

Convivemos no Brasil com uma profunda injustiça social, não se dá a proteção necessária as nossas crianças e adolescentes, os discursos são demagógicos, hipócritas, para depois se vociferar aos quatros ventos pela necessidade de leis mais duras, pelo encarceramento cada vez mais cedo.

Cumpra-se a lei e não se venha culpar o Poder Judiciário, pelas decisões que impõe ao Poder Executivo condenações a fornecer medicamentos, exames e tratamentos de saúde, moradia digna, vagas em creche, atendimentos psicológicos e sociais.

Um ótimo final de semana a todos.