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JUSTIÇA PREVIDENCIÁRIA

JUSTIÇA PREVIDENCIÁRIA

João Ricardo dos Santos Costa, presidente da AJURIS

 

A questão da Previdência dos Servidores Públicos retornou, com força, à discussão pública. Expressões como “déficit” e “bomba-relógio” voltam a ser ouvidas com espantosa freqüência, e a manutenção de um sistema que assegure uma remuneração semelhante à do cargo, após a aposentadoria, é confundida com privilégio.

A magistratura brasileira, convencida de que esse discurso tem como objetivo desmontar a Previdência Pública e a entregar à iniciativa privada, considera fundamental participar desse debate.

Nesse sentido, recentemente realizou, em Porto Alegre, por iniciativa da AMB – Associação dos Magistrados Brasileiros – e da AJURIS, com apoio da AJUFE, ANAMATRA e FONACATE, o Seminário “Justiça Previdenciária – Os Rumos da Previdência Pública Brasileira”, que, em sua conclusão, publicou a “Carta da Justiça Previdenciária”, cujo teor merece ampla divulgação, por traduzir o que sustenta a magistratura brasileira nesta fundamental discussão:

“O direito à previdência social, enquanto direito social que assegura ao trabalhador a proteção do Estado em caso de doença, invalidez, velhice e morte, tem sido construído desde os primórdios civilizatórios. A Declaração Universal dos Direitos do Homem e a Constituição Federal do Brasil expressam essa garantia, que se constitui em atributo de dignidade da pessoa humana. No caso da administração pública, a existência de uma Previdência integralmente pública e estatal, de responsabilidade de cada ente federado e com gestão participativa dos servidores e da sociedade, é condição para a manutenção de um serviço público de qualidade e comprometido na execução das funções estratégicas e indelegáveis do Estado.

Para a magistratura e demais funções típicas do Estado, mostra-se essencial o fortalecimento de um regime previdenciário próprio, público e integralmente estatal, único capaz de assegurar na plenitude a concretização das prerrogativas do cargo, como a imparcialidade e a independência e, em especial, a vitaliciedade, garantias cidadãs de um Estado Republicano. Para tanto, é necessário aprimorar os processos de gestão dos Regimes Próprios de Previdência e o seu caráter contributivo e solidário, capazes de assegurar o equilíbrio e a autossustentabilidade financeira e atuarial dos benefícios de aposentadoria e pensão atualmente estabelecidos na Constituição Federal, sem necessidade de quaisquer novas alterações.

Nesse contexto, a alardeada e inexistente crise da seguridade social representa apenas mais uma falaciosa justificativa para o desmonte da previdência social dos servidores e a entrega desse imenso patrimônio público ao mercado financeiro e especulativo internacional.

A regulamentação da instituição da Previdência Complementar do Servidor Público representará, se e quando consumada, o mero cumprimento do receituário do Banco Mundial para países periféricos e a privatização da Previdência Pública, com a redução do tamanho do Estado.

Por isso que os participantes do Seminário “Justiça Previdenciária – Os Rumos da Previdência Pública Brasileira”, promovido pela Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB – e a Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul – AJURIS –, em parceria com a Associação dos Juízes Federais – AJUFE –, a Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas – ANAMATRA – e o Fórum Nacional Permanente das Carreiras Típicas de Estado – FONACATE – mostram-se contrários ao desmonte da Previdência Pública e à implementação do Regime de Previdência Privada Complementar, sistema que, a par de não assegurar minimamente a percepção de um benefício futuro equivalente à remuneração em atividade, no que colide com a garantia republicana da irredutibilidade remuneratória necessária à independência da magistratura e das carreiras típicas de Estado, ainda se revela uma experiência que, mal sucedida em países vizinhos, expõe os servidores e os membros integrantes das carreiras típicas do Estado, bem como seus dependentes, aos riscos e azares do mercado financeiro justamente quando, no ocaso de sua vida produtiva, mais necessitam da proteção estatal. Nesse sentido, a lógica da desconstrução da Previdência Pública representa efetivo enfraquecimento de um Estado promotor do bem estar social, atingindo suas instituições e colocando em risco os fundamentos do Estado Democrático de Direito, em cujos pilares está o Poder Judiciário como instituição garantidora das liberdades públicas e dos direitos fundamentais e sociais.”