fbpx

Discriminação de ateus e agnósticos

Discriminação de ateus e agnósticos

Benedito Felipe Rauen Filho – vice-presidente Administrativo da AJURIS

 

Foi objeto de amplo noticiário local a campanha que a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos pretendia iniciar nos ônibus municipais, em face de discriminação que diz sofrer. Tudo se iniciou, ao que consta. em face de comentários de comunicador marrom de programa policial, o qual teria afirmado que só ateus são criminosos – ou coisa parecida – embora se desconheçam outras ações discriminatórias. A campanha não teve início, pois a ATP a recusou se dizendo amparada em lei municipal.

O que na verdade importa, deixando de lado a questão da lei local, é que ninguém, nenhuma minoria, por menos expressiva que seja, pode sofrer discriminação em face da maneira de pensar diferente da maioria, assim como aquela deve saber respeitar a última. O direito à liberdade de pensamento, inclusive a sua manifestação, bem como a inviolabilidade de consciência de crença – ou não-crença – é constitucionalmente assegurado em nosso sistema como cláusulas pétreas decorrentes da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Assim, é discriminatório afirmar que os ateus ou agnósticos só por tal condição seriam pessoas de má índole, tanto quanto é discriminação ridicularizar quem crê em Deus. Existem ateus e agnósticos que são boas pessoas e outros que são maus; existem crentes que são bons e outros que são maus. A crença ou não-crença não são pressupostos e nem excludentes de boa conduta por si sós.

Deste modo, em princípio não há problema que ateus e agnósticos façam campanha em defesa de suas convicções, assim como os crentes podem fazê-la em sentido contrário, mesmo porque a prática do proselitismo é da essência da condição humana. Exceção haverá aos princípios antes abordados, já que nenhuma proteção constitucional é absoluta e exclui as demais, quando sob o manto deles se pretenda fazer proselitismo de apologia ao crime ou conduta teratológica. A campanha proposta, tal como foi anunciada, se iniciaria com um cartaz contendo de um lado uma foto de Charles Chaplin e embaixo os dizeres “Não acredita em Deus” e de outro uma fotografia de Hitler e embaixo a legenda “Acredita em Deus”.

Ora, mesmo com todo respeito ao direito de expressão, não há como aceitar uma campanha com tamanha agressividade e grosseria. Se os ateus e agnósticos se sentem ofendidos quando genericamente os equivalem a pessoas más, não podem devolver a agressão com outra muito mais discriminatória e grosseira ao tentar induzir o público a entender que a condição de gênio do mal de Hitler decorreria da sua noticiada crença em Deus. Não bastava afirmar que Charles Chaplin, e outros ateus ou agnósticos, foram homens geniais e contribuíram para a humanidade? Era necessário redarguir de modo tão grosseiro, sem razoabilidade e proporcionalidade?

Aliás, vê-se quão mal feita e precipitada a campanha ao se ler que Chaplin não “acredita” e Hitler “acredita” em Deus, com o verbo no presente. Se eles ainda mantêm as convicções, onde a exercem? Na vida eterna? Erro grosseiro dos publicitários ou ato falho?

A diferença entre o remédio e o veneno pode ser a dose.