12 jan “Atentos aos sinais”, por Orlando Faccini Neto
Todo sistema político, apesar das garantias formais e das instituições, encontra, no fim, a figura do líder que o representa.
Em momentos de crises ou conturbações, a história demonstra, foram as personalidades de presidentes ou primeiros-ministros determinantes para a manutenção da democracia e o desenvolvimento dos valores mais significativos da civilização; noutros casos, porém, lideranças conduziram os seus povos à guerra, à ruptura dos padrões de convivência humanitária, ao caos.
Difícil é filtrar, no início, as aspirações de quem se propõe a conduzir a política nacional, de maneira que as instâncias partidárias, a imprensa, os formadores de opinião, devem estar atentos quanto à natureza destes pretendentes, pois a degradação da democracia se faz lentamente, impondo que estejamos atentos aos sinais.
O episódio ocorrido no Capitólio americano dá o seu testemunho.
Num país em que nunca se apresentaram golpes de estado, onde nunca houve concentração de poder, qual nas monarquias, e em cuja formação se observa uma inerente distribuição de competências aos variados entes que compõem a federação, mesmo neste país, a força da concitação de seu líder rendeu a invasão do parlamento, culminando com a morte de mais de uma pessoa.
Porque o presidente americano, desde muito antes do processo eleitoral, já o estava deslegitimando. Aludia ao risco de fraudes, indicava que não se conformaria com qualquer resultado que não fosse a sua vitória, instilava dúvidas sobre o tradicional uso dos correios, e, depois do pleito, recusou reconhecer a vitória de seu adversário, ao qual sequer conferiu o direito de realizar uma escorreita transição.
Não se trata de apanágio de um político de esquerda ou de direita. Obama transferiu-lhe o bastão com decência cívica, e o mesmo Obama, em sua autobiografia, elogia o modo adequado como o presidente Bush procedeu com relação a ele.
O problema, portanto, são os radicais. Aqueles que só creem na democracia quando essa lhes favorece. Que só acreditam no sistema de votação se logram vencer. Que desenvolvem discursos tendentes a deslegitimar o sistema, para darem como provadas fraudes inexistentes, acaso os seus objetivos não sejam alcançados.
Acionar os mecanismos de controle, o quanto antes, previne rupturas. É preciso estar atento e forte.
Orlando Faccini Neto é juiz de Direito e presidente da AJURIS. Artigo publicado na edição do dia 12 de janeiro de 2021 do jornal Zero Hora.