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A maior perda de nossas vidas, por Luis Carlos Rosa

A maior perda de nossas vidas, por Luis Carlos Rosa

Artigo de autoria do juiz de Direito Luis Carlos Rosa, publicado no dia 16 de julho em coluna
semanal 
no Jornal das Missões, de Santo Ângelo

Tenho a certeza que não existe perda maior na vida de uma pessoa, do que a perda de um filho, vivemos pelos filhos, canalizamos todos os nossos esforços e nossas expectativas por eles, atravessamos o fogo, oceanos, continentes pelos filhos, somos capazes de qualquer coisa pelos nossos rebentos, não tenho dúvidas de que um pai ou uma mãe daria a vida por seus filhos.

Penso que se existisse uma regra maior imposta pelo criador, deveria ser a da  proibição suprema de que nenhum filho poderia morrer antes de seus pais, a inversão desta ordem natural marca para sempre a vida dos pais, todos os dias, todos os momentos, do abrir dos olhos pela manhã, até o sono da noite, trata-se de uma dor sem paralelo, não posso sequer imaginar que um dia isso venha acontecer comigo, muito de mim morreria ali, como infelizmente vi acontecer com amigos e pessoas próximas.

Presenciei essa semana, durante uma das tantas audiências no Juizado da Infância e Juventude, uma cena que interpretei como uma perda simbólica, não uma morte física, mas uma perda de um filho, para um humilde pai de mãos calejadas, trabalhador, com a face queimada pelo sol, que ainda guardava um fio de esperança na volta para casa de seu filho. Aliás, pai nenhum abandona o filho, aconteça o que acontecer, pelo menos assim deveria de ser.

Tratava-se de uma audiência com um jovem que recém completou seus 18 anos de idade, interno do CASE – instituição de internação de adolescentes infratores – sendo designada a solenidade para avaliar a indisciplina do jovem, além de definir um pedido de transferência para uma outra unidade da FASE, fruto dessa indisciplina.

O pai, pessoa extremamente humilde, daquelas que em um breve diálogo, percebe-se a sinceridade, honestidade e respeito, compareceu à audiência, da qual participaram, ainda, o Ministério Público, a Defensoria Pública, integrantes da CASE, além deste colunista, na condição de magistrado, ocasião em que constatei a postura de desafio do jovem, postura de quem não está minimamente disposto a baixar a cabeça e reconhecer seu erros, postura de quem não consegue perceber que existe todo um trabalho sendo desenvolvido para sua ressocialização, nenhuma ponta de arrependimento, nada, só desafio, afronta e desrespeito, retirando qualquer possibilidade de permanência na Unidade de Santo Ângelo, que digo aos leitores, tem a menor população de internos do sistema FASE.

A postura da jovem foi totalmente contrária a do pai, que pediu para que o filho fosse mantido em cumprimento da medida em Santo Ângelo, implorando para que se desse outra oportunidade a ele, dizendo que não teria como visitar o filho na cidade para a qual estava sendo definida a transferência, nas palavras do pai “sou pobre, não posso, não tenho condições”, “desse jeito terei que abandonar meu filho”, “não tenho como ir até lá”, chegou ele a pedir que o filho fosse encaminhado ao Presídio de Santo Ângelo, como se isso fosse possível.

Refletindo sobre o ocorrido, coloquei-me na posição do humilde pai e dos inúmeros pais que, no dia a dia, perdem seus filhos para um traficante, para a criminalidade, deixam de ser respeitados, vendo os filhos sair de sua proteção e de seus olhos, para se afundar em um lamaçal difícil de ser superado.

Quando faço essas reflexões sinto que cresço como pessoa, me dá uma vontade irresistível de abraçar meus filhos e de dizer o quanto os amo. Façamos isso, todos os dias de nossas vidas, enquanto Deus nos permitir. Para quem não pode mais fazer isso pela dor extrema da perda, não existem palavras suficientes para consolá-los, que fiquem as lembranças boas e a certeza do amor eterno.