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‘Quem matou Odete? Provavelmente, não saberemos’, por Jayme Weingartner Neto

‘Quem matou Odete? Provavelmente, não saberemos’, por Jayme Weingartner Neto

Perdão pelo apelo, pouco original em tempos de economia da atenção. Vamos falar de assassinatos, um tema, para dizer o menos, desagradável. Em 2024, foram 44 mil no Brasil (o número está em queda há mais de dez anos, uma boa notícia). Mas a taxa está em 20,8 por 100 mil habitantes, muito acima do aceitável.

Pior, dos acontecidos em 2023, apenas 36% dos casos foram esclarecidos até o final de 2024 (Onde Mora a Impunidade, Instituto Sou da Paz; em dez anos, a elucidação oscila entre 35% e 44% – a média mundial é de 63%; nas Américas, o pior dos continentes, 43%). Significa que, dos homicídios registrados em 2023, dois a cada três não tinham, no final de 2024, nem uma pessoa denunciada pelo Ministério Público. E seria útil saber mais das vítimas.

Esse indicador é o mais próximo de uma estatística nacional e abrange 17 Estados. O RS, com outros nove, não está contemplado, provavelmente pela dificuldade de extrair automaticamente dos sistemas a data do homicídio. Onde há informação, descobrimos que o Distrito Federal tem 96% de casos resolvidos, contra 13% na Bahia.

Seja como for, somos pouco eficientes neste campo, o que se reflete, diretamente, nos presídios: apenas 13% dos mais de 670 mil detentos estão presos por homicídio – a maioria responde por crimes contra o patrimônio (40%) e relacionados a drogas (31%), nos quais há mais flagrantes, fruto da prioridade no policiamento ostensivo (em detrimento da investigação?) e talvez de certas invisibilidades construídas (o quê, afinal, e quem combater?).

Muitas vidas perdidas, quanta dor, impunidade. O Atlas da Violência (IPEA/Fórum Segurança Pública) informa que 135 mil casos não foram elucidados entre 2013-2023. Sei do empenho das polícias e do MP para aperfeiçoar a sistemática.

Minha reflexão: precisamos, coletivamente, melhorar este enfrentamento. Para além daquele simplório “a Polícia prende, o Judiciário solta”, tornar a investigação mais inteligente e técnica, repensar prioridades, perceber que o mero aumento de pena (a do feminicídio já está em 40 anos) não impacta diretamente nestes problemas objetivamente descritos.

Jayme Weingartner Neto
Desembargador Tribunal de Justiça do RS e professor da Escola de Direito da PUCRS
Publicado na edição de 17/10/2025 do jornal Zero Hora