11 ago Desafios da execução penal e construção da imagem do inimigo pautam painel do Seminário Sistema Prisional e Direitos Humanos
O segundo painel do Seminário Sistema Prisional e Direitos Humanos, promovido pela AJURIS, nesta quinta-feira (11/8), debateu sobre a construção da imagem do inimigo, os rumos da execução penal e a falência do atual sistema. Para discutir o tema, o professor da USP e especialista em psicologia criminal e criminologia clínica, Alvino Augusto de Sá, e como debatedores o juiz de Direito Orlando Faccini Neto e o pós-doutor em sociologia Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo. A coordenação da mesa ficou a cargo da vice-presidente Administrativa da AJURIS, Vera Lúcia Deboni.
Durante a sua manifestação, Alvino de Sá esclareceu sobre o processo de migração de inimigo individual da vítima para a imagem de inimigo coletivo na condição de pessoa julgada. Nesse contexto, o professor da USP explica que, a partir julgamento por parte do Estado, o indivíduo que cometeu um ato criminoso se transforma em “inimigo alienígena ou estrangeiro”, ou seja, estranho à sociedade: “Então ele não cometeu um assalto, ele é um assaltante”, exemplificou, citando que, diversas vezes, a imagem de criminoso é atribuída como se fosse algo inerente ao ser humano.
No entendimento de Alvino Sá, após esse processo, a pessoa assume a autoimagem de inimigo, momento em que representa uma ruptura do diálogo com a sociedade: “O criminoso vai ver que a sociedade o enxerga como inimigo, então ele realmente se torna um. O processo não é mais externo, e sim interno”.
Dentro desse conceito migratório, o especialista em criminologia aponta que, no seu entendimento, um dos grandes desafios da execução penal é não se deixar contaminar por esse processo: “A situação do cárcere não é caótica, ela é programática. Fomentar o diálogo institucional cárcere-sociedade é uma tentativa de resgatar a relação”, sugeriu.
Debatedor da palestra, o juiz de Direito Orlando Faccini Neto, que está atuando como assessor no Superior Tribunal de Justiça (STJ), analisa que o tema, no entanto, carece de um contato mais empírico. Doutor em Ciências Jurídico-Criminais, Faccini relata que as teorias sobre execução penal, por vezes, acabam sendo elaboradas sem considerar que o sistema prisional não oferece as mínimas condições para o cumprimento da pena: “O Estado Brasileiro, como um todo, é omisso”, citou, ponderando, também, sobre o distanciamento em relação ao que apontam os estudos acadêmicos e o que pensa, de fato, a população.
Um dos exemplos, para o magistrado, está na ausência da questão da culpa em teorias como a ideologia do inimigo: “Não se fala mais em culpa. Não há recuperação, melhora ou ressocialização sem a experiência do sentimento de culpa. É importante que confronte o criminoso com a dor que ele produziu na vítima”, cita, trazendo o exemplo da Justiça Restaurativa que, no seu entendimento, é um dos mecanismos que mais se aproxima dessa lógica.
Para Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo, contudo, uma das problemáticas do país é a “cultura da simplificação”. Ele justificou a partir de um diálogo com um parlamentar, que apontou na reformulação do Código de Processo Penal apenas a necessidade de atender os anseios da população, independente do que apontam os estudos sociológicos: “Eu não entregaria a vitória de bandeja para o sensos comum. Estamos prestes a abrir mão de uma teoria moderna para retornar ao cumprimento de penas medievais”, frisou, em relação as cobranças por medidas privativas de liberdade cada vez mais rígidas.
Como coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUCRS, Ghiringhelli aponta, na sua visão, a falência de todo o sistema de segurança pública: “Vivemos um debate desfocado, onde temos altíssimas taxas de violência”, pontou. Ele também critica que, diante desse cenário, diversas autoridades e agentes da segurança pública do Estado declarem que o problema da área são as penas brandas. “O problema é complexo e não há donos da verdade, mas precisamos enfrentar esse tema.”
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Joice Proença
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