14 dez Um Estado democrático e forte, por Pio Giovani Dresch
Pio Giovani Dresch *
O Estado brasileiro tem compromisso com a consolidação de uma sociedade democrática e com a busca de uma maior justiça social, tarefas que lhe foram atribuídas pelo constituinte de 1988. Tais definições permeiam os três Poderes, que, independentes e harmônicos, e cada qual com suas atribuições próprias, devem submeter-se às diretrizes constitucionais.
Decorridas mais de duas décadas, e em relação a cada um dos Poderes, não é possível dizer que foi cumprida a promessa feita pela Constituição à cidadania. No Judiciário, o exponencial aumento de demandas demonstra que se facilitou o acesso à justiça e que cresceu a expectativa dos cidadãos em nele encontrarem respostas às suas postulações.
Todavia, o fenômeno evidencia uma causa e uma consequência preocupantes: na ponta inicial, não há como deixar de se associar as milhares de ações levadas ao conhecimento dos juízes à existência de uma anterior lesão, muitas vezes decorrente de omissão do próprio poder público; na ponta final, da efetiva prestação jurisdicional, o excesso de ações escancarou os limites materiais de um Poder que não mais consegue dar resposta adequada a tal volume de demandas e corre o risco de assemelhar seu serviço a tantos mal prestados pelo Executivo, como a saúde, educação, previdência, segurança.
É de se ressaltar que talvez o maior responsável pelo excesso de demandas seja o próprio Estado, pela prestação deficiente dos serviços públicos e por omitir-se do controle de atividades subordinadas à sua disciplina, como os serviços bancários, de seguros, energia elétrica, telefonia e tantos outros.
Também o Legislativo tem sua parcela de responsabilidade, na medida em que tarda a dar soluções em vários planos. Cabe lembrar que aguarda aprovação a nova ação civil pública, que em muito reduzirá as ações individuais; do mesmo modo, há muito a fazer para, entre os diferentes tipos de delitos, priorizar a punição dos crimes de maior lesividade social, como os de corrupção e os praticados pelo crime organizado.
Por outro lado, se é importante assinalar o débito do Estado, por seus três Poderes, em relação às promessas constitucionais, não deve a crítica ignorar os avanços ocorridos nos últimos 23 anos, nem servir de argumento para propostas de encolhimento do Estado.
Deve ficar claro que as críticas fáceis endereçadas a toda atividade estatal, como se fosse por definição ineficiente, perdulária e corrupta, não podem servir de mote para a tentativa de redução de seu tamanho, como se de outro lugar que não do âmbito público pudessem se desenvolver em larga escala as políticas para a efetiva realização da justiça social.
O Estado deve ser a um tempo forte e democrático. Deve ser forte para cumprir sua função de agente implementador do desenvolvimento econômico e, mais do que isso, para oferecer os serviços públicos que lhe incumbem; deve ser democrático – e não apenas formalmente – para assegurar, com sua transparência, que a sociedade tenha maior ingerência na gestão pública.
* Presidente eleito da AJURIS
Publicado em Zero Hora, no dia 13/12/2011