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Mês da mulher: Relatos de luta contra a invisibilidade marcam debate sobre preconceito

Mês da mulher: Relatos de luta contra a invisibilidade marcam debate sobre preconceito

A luta contra a invisibilidade move todos os dias uma mulher trans e negra, uma mulher negra, uma jovem gorda, uma advogada feminista. Essa linha que une todas essas mulheres é um obstáculo visível na sociedade brasileira, mas incompreendido e ignorado.

Mulheres x Preconceitos painel realizado pela AJURIS, nesta quinta-feira (16/3), abriu espaço para relatos pessoais em uma importante noite de debate sobre as principais barreiras a serem superadas numa sociedade marcada pelo machismo, abordando os diversos tipos de discriminação de gênero.

eventomulheres10A filósofa e especialista em Educação Adriana Souza, negra e transexual, contextualizou a sua atuação como Coordenadora Estadual da Diversidade Sexual e de Gênero na  Secretaria de Desenvolvimento Social, Trabalho, Justiça e Direitos Humanos do RS, relatando a sua origem, nascida na década de 80, em uma família tradicional de pecuaristas de Itaqui, primogênita de primogênito, que se sentia desconfortável na situação de menino. “O privilégio dos lugares também nos desafiam. Os lugares onde a gente está fazem com que a gente saiba qual é o nosso papel social. A gente não pode mudar o mundo, mas pode contribuir para que esse mundo seja melhor”.

Ela explicou que a população de mulheres trans, de travestis, sofrem preconceito, primeiro por uma questão de invisibilidade: “não são empoderadas de fala”. A invisibilidade segue, pontua Adriana, também nas estatísticas que não contemplam essa população: “os dados sequer são coletados”.

Diante desse contexto, ela destaca o trabalho para que os espaços sejam minimamente acolhedores para essas pessoas. “Acolhedor quando falo é  simplesmente que não cause estranhamento, que a pessoa entre e saia como qualquer outra”. Quando se trata de educação Adriana destaca que nenhuma escola em Porto Alegre tem condições mínimas de receber essas pessoas. E quando se fala em reinserção social, quando se busca trabalho, somente três redes de supermercado contratam pessoas trans e, se tiver, nível superior, algumas empresas da área de tecnologia.

eventomulheres9Encontrar o lugar de fala também foi um desafio para a escritora e youtuber Ana De Cesaro, que enfrentou o problema da obesidade e o preconceito da própria família até se reconhecer mulher. Famosa por um canal no Youtube que incentivava o emagrecimento saudável – Ana gostosa –  que tinha o objetivo de ela se gostar de novo, de ter uma vida gostosa. “Eu só acho que eu tenho que ter o direito de sair na rua sem ter medo de ser violentada. Quando o homem sai na rua ele tem medo que levem o celular, o dinheiro ou a carteira. Quando eu saio na rua eu tenho medo que levem a minha vida, o meu corpo”. Ela contou o caminho que percorreu até mudar o rumo do canal, depois de ter sofrido um estupro dentro da própria casa, fato que ela só revelou para mãe após quatro anos. “Eu não tive coragem de denunciar, porque eu achei que ele poderia voltar e me matar. Eu finalmente entendi porque estas feministas lutam tanto. Eu falava todos os chavões machistas, sem pensar no que estava falando. Eu uso as minhas redes para empoderar mulheres”. Ana destaca ainda que conseguiu entender que a culpa não era do que estava usando, do que estava vestindo, era do cara, que era um criminoso.

eventomulheres14Sair da invisibilidade também é o que move Maria Conceição Fontoura, que há 30 anos fundou com outras mulheres negras a ONG Maria Mulher e é doutora em Educação. Ela relatou que no próprio movimento em que haviam homens e mulheres sofreu discriminação e por isso, a ONG somente de mulheres foi criada. “Para armar todo o circo, as mulheres negras serviam, mas na hora de fazer a fala não”.  

 

eventomulheres13A fundadora da ONG Themis Denise Dora, que é ouvidora-geral da Defensoria Pública do RS, destacou as leis e as práticas jurídicas que colaboram para construção de preconceitos. Advogada, defensora do feminismo desde os 16 anos, ela propôs uma reflexão sobre como enfrentar esse pré-conceito e reposicionar o lugar das mulheres e também dos homens na sociedade. Ela citou o primeiro Código Civil de 1916 em que havia um capítulo sobre a família, que colocava o homem como chefe da sociedade conjugal e a mulher é como sua colaboradora.  “O Direito estrutura um lugar para a mulher na sociedade e a gente só muda isso por uma luta política muito forte. Isso implica no deslocamento do masculino também, não é o jogo em que todo mundo sai ganhando, há necessidade de se repensar os lugares. Isso está em xeque”. Um primeiro marco dessa luta, ela referiu como a busca pelo voto, somente em 1934.

A defensora destacou, ainda, que é um processo de luta coletiva, em que instituições, movimentos sociais, precisam estar em aliança. “Sem isso corremos o risco de reproduzir na sociedade brasileira contemporânea questões medievais”.

A mediação foi realizada pela diretora Cultural, Marcia Kern. Prestigiaram o evento o presidente da AJURIS, Gilberto Schäfer, a vice-presidente Cultura, Rute Rossato, o diretor de Direitos Humanos, Mauro Borba, magistradas e magistrados e a comunidade em geral.   


Antes do painel foi realizado o lançamento da Revista Themis, que celebra 24 anos da ONG. O tema da edição é Novas tecnologias sociais no enfrentamento da violência contra as mulheres. A Revista pode ser acessada gratuitamente no link https://themis.org.br/publicacoes-e-obras/.

 

 

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